A Polícia Militar Ambiental, além de biólogos e médicos veterinários do Grupo de Resgate Técnico Animal Cerrado Pantanal (GRETAP-MS) desencaderam operação nas regiões do Abobral e Nhecolândia para atender jacarés que foram identificados em condições de perigo com relação à disponibilidade de alimentação.
O grupo, que envolveu policiais de Campo Grande e Corumbá e integrantes do GRETAP-MS que atuam no bioma, destinou cerca de 300 kg de carne para alimentar 250 jacarés. A atuação começou nesta quarta-feira (27) e segue em manutenção. A estiagem longa no Pantanal e falta de lagoas e outras áreas úmidas tanto no Abobral como na Nhecolândia está gerando impacto negativo para população desses animais, que estão enfrentando dificuldade na alimentação.
“A operação foi dividida em duas fases, a primeira, que aconteceu ontem (27), foi para prestar o atendimento emergencial aos animais que estão divididos em duas regiões do Pantanal, na região do Abobral e Nhecolânida. Foram disponibilizados 300 kg de proteína animal (carne) para os bichos. Os jacarés estavam extremamente debilitados e nem se mexiam, devido à desnutrição. A segunda fase será de monitoramento por uma equipe do GRETAP”, divulgou a Polícia Militar Ambiental, em nota.
Os profissionais especialistas farão o acompanhamento dos animais por 20 dias, com o objetivo de verificar se os animais conseguirão, após alimentados, fazerem a travessia das áreas afetadas até uma outra área que tenha oferta de água e alimento. A intenção é garantir que os jacarés consigam, por eles mesmos, seguirem até regiões próximas ao rio Paraguai e outros cursos d’água. Se não conseguirem, haverá o manejo desses 250 animais.
“Uma força tarefa será montada e eles serão capturados e transportados até uma área onde possam obter recursos para a sobrevivência, que tenha oferta de alimento. Apesar de muitos animais estrarem em condições críticas, nenhum veio a óbito até o momento”, ressaltou a PMA.
A população de jacarés no Pantanal está sofrendo uma grave ameaça por conta das condições que o bioma enfrenta desde 2019. A estiagem mais severa causou grande impacto nesses répteis que dependem da água para sobreviver. Eles são animais de sangue frio e dependem do sol e da água para conseguirem regular sua temperatura corporal. Além disso, é no meio aquático que eles têm maior mobilidade, conseguem caçar e melhor se refugiam das presas.
A espécie de jacaré que vive no Pantanal é a Caiman yacare. Desde o ano retrasado, há ocorrência de dezenas e centenas desses animais serem encontrados próximos a açudes de propriedades rurais, a procura de água. Um dos primeiros registros desse tipo ocorreu em novembro de 2020. Na fazenda Palmeirinha, que fica na Nhecolândia, em Corumbá, centenas de jacarés, de diferentes tamanhos, estavam todos amontoados em açudes. Alguns desses animais até tentaram atacar bezerros, mas estavam fracos e fora da água eles não possuíam a mesma agilidade para caçar.
Em 2021, no começo de outubro, houve outra situação semelhante ao ocorrido na Fazenda Palmeirinha. Em um corixo praticamente seco perto do rio Pixaim, em Poconé (MT), centenas de animais foram encontrados e apresentavam sinais de fraqueza. O Ibama na região chegou a montar uma operação para tentar transportar alguns desses jacarés para outras áreas. Nessa localidade, estima-se que 600 jacarés compartilhavam uma área que não comportava esse total de população. Os répteis estavam desnutridos e o calor excessivo estava atrapalhando a sobrevida deles.
“A ameaça é a falta/escassez hídrica que diminui drasticamente seus ambientes e assim causa morte de indivíduos. O Pantanal abriga uma população vigorosa em anos de oferta de ambientes, em torno de 3 milhões de indivíduos, dados da Embrapa. Mas nesses últimos 3 anos a seca severa tem causado mortes de indivíduos”, explicou a pesquisadora Zilca Maria da Silva Campos ao Correio do Estado, em entrevista anterior ao registro desses 250 jacarés localizados neste mês de julho no Abobral e na Nhecolândia. A engenheira florestal, doutora em Ecologia, é pesquisadora da Embrapa desde 1989 e é especializada em manejo da vida silvestre, atuando principalmente com jacarés do Pantanal.
Os jacarés são reconhecidos por serem muito resistentes. Eles conseguem passar meses sem comer e gastam a energia acumulada em período de fartura. Por isso conseguem adaptar-se aos períodos de cheia e seca do bioma. Seu sistema circulatório é capaz de concentrar a circulação de sangue apenas para o coração e o cérebro em períodos mais agudos para sua sobrevivência. Essa forte estrutura atualmente está sendo desafiada pela estiagem prolongada, praticamente sem períodos de cheia desde meados de 2019 até este ano.
Sem um ambiente aquático mais favorável, os jacarés pantaneiros dependem de mais tempo para se manterem vivos e a sua reprodução fica prejudicada.
Fonte: Correio do Estado