Com um mês do caso Sophia, nada mudou no combate à violência contra as crianças

Por trás dos erros do sistema de saúde, da Justiça e do Conselho Tutelar, o caso Sophia de Jesus Ocampo completa um mês neste domingo sem que mudanças no combate à violência contra a criança de fato tenham saído do papel em Mato Grosso do Sul.

Até o momento, as medidas anunciadas para que casos como o da menina de apenas dois anos não se repitam continuam como promessas.

A Secretaria de Estado de Justiça e Segurança Pública (Sejusp) havia anunciado no dia 15 deste mês a implementação de uma sala de atendimento à criança vítima de violência dentro da Casa da Mulher Brasileira.

Na prática, o Estado só propôs medidas para atendimento às vítimas após os crimes serem consumados, o que, de forma imediata, não é suficiente para evitar que crianças e adolescentes continuem sendo as maiores vítimas de violência sexual em Mato Grosso do Sul.

Correio do Estado entrou em contato com a Sejusp questionando se a sala destinada ao atendimento a crianças já começou a funcionar. No entanto, não obteve resposta até o fechamento desta edição.

A Secretaria Municipal de Saúde Pública (Sesau) de Campo Grande continua conduzindo a investigação para apurar as falhas cometidas contra Sophia.

Em apenas dois anos de vida, a menina passou por 30 atendimentos nas unidades de pronto atendimento (UPAs), onde nenhum profissional identificou que a criança estava em situação de violência.

Ao Correio do Estado, a advogada que representa o pai de Sophia, Jean Carlos Ocampo, e seu marido, Igor de Andrade, Janice Andrade, afirmou que os órgãos que deveriam zelar pela proteção das crianças ainda estão perdendo tempo com as burocracias.

“Ainda não tivemos resultado das apurações, inclusive, das falhas da rede de proteção à criança. Mas ainda temos muito o que avançar, principalmente na aplicação da Lei Henry Borel, quando está acontecendo diversos conflitos de competências no sistema judiciário”, disse a advogada.

BUSCA POR JUSTIÇA

Para honrar a memória da menina Sophia de Jesus Ocampo, morta após ser agredida pela mãe, Stephanie de Jesus da Silva, de 24 anos, e pelo seu padrasto, Christian Leitheim, de 25 anos, no dia 26 de janeiro, os familiares e os amigos da criança realizarão uma passeata para pedir justiça, neste domingo às 16h30min, no Parque das Nações Indígenas.

A concentração será feita na frente do Bioparque Pantanal. O local foi escolhido porque, na semana em que a menina veio a óbito, seu pai estava planejando levá-la para conhecer o lugar.

Em entrevista exclusiva ao Correio do Estado, o pai de Sophia, Jean Carlos Ocampo, e seu marido, Igor de Andrade, relataram que mesmo após a morte da criança o casal segue em busca de justiça.

De acordo com o casal, além de todas as negligências sofridas pela menina enquanto estava viva, agora a luta também é para que a luta por justiça não seja silenciada e para que a verdade sempre prevaleça.

Ainda segundo Jean e Igor, os setores envolvidos na investigação do caso desde que o primeiro boletim de ocorrência foi registrado, em janeiro de 2022, agora tentam construir a narrativa de que foi feito tudo que era possível para tirar Sophia da convivência de seus agressores.

“Foi uma forma de silenciar tudo que está acontecendo e desmotivar as nossas manifestações”, afirmou Igor, ao comentar declarações dadas por autoridades durante a audiência pública, realizada na Câmara Municipal, no dia 15 de fevereiro, para debater violência contra crianças e adolescentes.

CASOS RECORRENTES

No dia 14 de fevereiro, mais um caso de agressão à criança resultou na prisão em flagrante de uma mãe e padrasto, em Campo Grande.

O casal foi detido pela Polícia Civil, por meio da Delegacia Especializada de Proteção à Criança e ao Adolescente (DEPCA), após o filho da mulher, um bebê de apenas um ano e um mês, ser internado em estado grave com lesões na cabeça e indícios de violência.

O laudo médico apontou que o bebê teve duas clavículas quebradas, traumatismo craniano e pneumotórax. Ele chegou a ficar internado em estado grave na Santa Casa de Campo Grande, respirando com a ajuda de aparelhos.

Conforme o boletim médico mais recente da instituição, a criança permanece acordada sob os cuidados do hospital, respirando sem ajuda de aparelho com quadro clínico estável.

Ao Correio do Estado, o pai da criança, que preferiu não se identificar e que já havia denunciado os casos de violência contra o seu filho ao Conselho Tutelar, destacou que o órgão que deveria zelar pela proteção dos mais vulneráveis não lhe deu uma devolutiva de como estava o caso.

“Me fizeram uma falsa promessa de que continuariam visitando a casa para ver como meu filho estava vivendo. E, para mim, é uma instituição insignificante, que, se não faz o seu papel, não deveria existir. É mais um caso em que houve descaso, com um serviço preguiçoso e desumano”, salientou o pai do bebê.

Ele destacou ainda, que considera comparecer à passeata no domingo organizada para buscar justiça contra todos os erros que foram cometidas contra Sophia.

Saiba: Dados da Sejusp apontam que, entre os dias 1º de janeiro e 24 de fevereiro deste ano, Mato Grosso do Sul registrou 168 casos de estupro contra crianças de zero a 12 anos.

Em relação aos adolescentes, 80 pessoas de até 17 anos sofreram violência sexual em 2023. Juntos, os dois grupos representam 81,84% dos 303 estupros contabilizados no Estado até essa sexta-feira.

 

Fonte: Correio do Estado

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