Em junho, o Congresso Nacional aprovou a Medida Provisória (MP) 1106/2022 que aumenta a margem para empréstimos consignados e libera a contratação por beneficiários do programa Auxílio Brasil (PAB). A medida foi sancionada na semana passada.
De acordo com o Ministério da Cidadania, Mato Grosso do Sul tem 197.808 pessoas com acesso ao benefício e que poderão contratar o empréstimo. Apesar de a medida ampliar o crédito, economistas alertam para o risco de endividamento para a população mais vulnerável.
Com a promulgação, o Ministério da Cidadania agora deve editar as regras para que as instituições financeiras interessadas possam fornecer o serviço. Até agora, os dois bancos estatais, Caixa Econômica Federal (CEF) e Banco do Brasil, serão os primeiros credores. Também já anunciaram a linha de crédito os bancos Pan, Safra e Facta Financeira.
Grandes bancos como Bradesco, Itaú, Santander, Nubank e BMG anunciaram que não oferecerão a modalidade de empréstimo. Na tarde de ontem, o presidente Jair Bolsonaro se reuniu com empresários do setor e pediu juros menores para esse tipo de financiamento.
O empréstimo consignado do Auxílio Brasil poderá ser pago em até 48 meses. Já a margem consignável, que é o valor máximo que pode ser comprometido do benefício, será de 40% para o pagamento do crédito. Com isso, o auxílio médio de
R$ 600 gera uma dívida mensal dedutível de R$ 240, sobrando R$ 360 para as famílias.
A modalidade é uma das menos arriscadas, pois o pagamento é feito diretamente na fonte, dando pouca margem para a inadimplência.
Professor de economia da Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul (UEMS), Matheus Abritta comenta que, apesar disso, os juros a serem praticados para a faixa são muito altos, gerando ainda mais insegurança para as famílias já em vulnerabilidade social.
“Para termos uma ideia, o juro do consignado do funcionário público é de 1,5%, o de aposentados 1,87%, o de trabalhadores da iniciativa privada 2,6%, e o de beneficiários do auxílio chega a 5,85% ao mês”, explica.
O professor comenta que a situação é muito arriscada para essas famílias. “A medida é preocupante, porque estamos em um país com educação financeira não muito difundida, as pessoas tomam decisões econômicas sem ter todo o conhecimento”, completa.
O mestre em economia Eugênio Pavão é ainda mais categórico e considera a medida como algo muito prejudicial. “O consignado representa mais ‘corda para enforcar’ as já combalidas classes D e E”, sentencia.
Segundo ele, o empréstimo consignado representa mais um risco do que um benefício. “Apesar de ser melhor que outras modalidades de empréstimos, a fácil obtenção vai estimular a aquisição e o posterior pagamento de juros”, avalia.
Além do Auxílio Brasil, a medida permite que pessoas inscritas no Benefício de Prestação Continuada (BPC), pago a idosos e pessoas com deficiência de baixa renda, e do Renda Mensal Vitalícia (RMV) também contraiam empréstimos descontados em folha.
O presidente fez um apelo ao segmento e pediu que os juros cobrados sejam reduzidos. “Faço apelo para vocês agora, vai entrar pessoal do BPC no consignado. Isso é garantia, desconto em folha. Se puderem reduzir o máximo possível”, afirmou Bolsonaro.
CUIDADO
O doutor em economia Michel Constantino, assim como os demais colegas, pondera que, historicamente, o brasileiro tem um perfil de pouca educação financeira.
“É importante o uso com limites desse recurso. O empréstimo não reduz o recebimento, ele antecipa o recebimento, e esse é o ponto importante. As famílias devem avaliar com cuidado essa antecipação, para valer a pena comprar hoje ou deixar para o futuro”.
Constantino diz ainda que existem pontos positivos na possibilidade de se fazer um consignado, tanto em nível familiar como para a macroeconomia.
“O beneficiário tem maior liberdade de uso do recurso e melhora a expectativa de consumo futuro, impacta positivamente no comércio local, no fluxo financeiro das empresas e no uso dos recursos financeiros”, argumenta.
Abritta levanta o ponto de que essa modalidade de empréstimo é muito arriscada para as famílias, mas muito pouco arriscada para as instituições financeiras. Para professor da UEMS, o risco é baixo para as instituições financeiras, por ser descontado na fonte.
“Se a pessoa pegar o consignado, o auxílio de R$ 600 pode virar uma parcela de R$ 240. Para pessoas em situação de vulnerabilidade e sem educação financeira, é recomendado que se pegue o consignado apenas em caso de absurda necessidade, senão o benefício fica todo para o pagamento dos altíssimos juros”, alerta.
Dados do Ministério da Cidadania apontam que 23.771 famílias foram inseridas no programa em Mato Grosso do Sul para receber o Auxílio Brasil.
Atualmente, o benefício será de R$ 600 até dezembro, mas candidatos à Presidência e o próprio governo federal já estudam uma forma de manter o valor em 2023. Até junho, eram 176.442 famílias contempladas em MS, sendo 46.858 só em Campo Grande. Com a ampliação do programa, agora são 197.808.
Caminhoneiros não poderão contratar
A partir de hoje, os caminhoneiros autônomos começam a receber o Benefício Emergencial aos Transportadores Autônomos de Carga (BEm Caminhoneiro). Em MS, de acordo com o Sindicato dos Caminhoneiros em Mato Grosso do Sul (Sindicam-MS), 19 mil motoristas autônomos sindicalizados no Estado receberão o benefício.
Como o auxílio será pago por apenas seis meses (de julho a dezembro), a modalidade não tem acesso ao empréstimo consignado. As duas primeiras parcelas serão pagas hoje, referentes aos meses de julho e agosto; por isso, os trabalhadores receberão, excepcionalmente, R$ 2 mil.
Os lotes seguintes, de R$ 1 mil (cada), estarão disponíveis para pagamento nos dias 24 de setembro, 22 de outubro, 26 de novembro e 17 de dezembro.
Outra categoria que receberá benefício do governo federal é a dos taxistas. Os profissionais também não terão acesso à modalidade de empréstimo liberada na MP.
Em Campo Grande, 401 motoristas terão acesso ao auxílio. O número exato de quantas pessoas receberão os valores em todo o Estado ainda não foi divulgado. Os taxistas vão receber as parcelas de julho e agosto no dia 16. O valor é o mesmo dos caminhoneiros, R$ 1 mil, totalizando R$ 2 mil no primeiro depósito.
Os benefícios serão pagos aos caminhoneiros e aos taxistas para enfrentar o estado de emergência decorrente da elevação do preço dos combustíveis.
Fonte: Correio do Estado