Justiça de MS bloqueia bens de empresas rés em esquema bilionário de pirâmide

A Justiça em Campo Grande determinou o bloqueio de valores e bens da Trust Investing, outras empresas do grupo e seus representantes legais na ação civil pública que trata do dano coletivo a 1,3 milhão de pessoas no País. As vítimas são investidores lesados no esquema de pirâmide financeira descoberto na Operação La Casa de Papel, deflagrada pela Polícia Federal, em outubro de 2022.

O bloqueio deferido parcialmente pelo juiz Marcelo Ivo de Oliveira, da 2ª Vara de Direitos Difusos, Coletivos e Individuais Homogêneos, atende pedido do IPGE (Instituto de Proteção e Gestão do Empreendedorismo), entidade com sede em Santos (SP) e recai sobre nove réus, sendo seis pessoas físicas e três jurídicas.

O IPGE informou à Justiça que a movimentação no esquema de pirâmides alcançaria a cifra de R$ 4 bilhões, citando o valor que consta na denúncia protocolada pelo MPF (Ministério Público Federal) na Vara Federal de Campo Grande.

No despacho na ação que tramita na esfera estadual, o juiz concedeu o bloqueio, mas não limitou a um valor específico, abrindo margem para confisco bilionário do total estimado em prejuízo aos clientes.

O IPGE entrou com ação em Campo Grande por ser a comarca onde tramita a ação decorrente da Operação La Casa de Papel, que tramita na 3ª Vara da Justiça Federal.

Segundo a advogada Mayra Vieira Dias, que representa o IPGE, a entidade é focada na defesa do consumidor e no combate às fraudes financeiras. Em todo o País, o instituto já ingressou com cerca de 100 ações contra empresas responsáveis por crimes de pirâmide financeira. Em Campo Grande, a ação tramita em segredo de justiça, tendo sido protocolada em 2023.

Na última quinta-feira (23), o despacho judicial deferiu parcialmente a liminar, determinando-se apenas o bloqueio de valores pelos sistemas Sisbajud (Sistema de Busca de Ativos do Poder Judiciário) e o Renajud (sistema on-line de restrição judicial de veículos) de “eventuais bens e valores remanescentes e que não foram bloqueados pela Justiça Federal à época da operação La Casa de Papel”.

O juiz também determinou que a Justiça Federal seja oficiada, para que compartilhe informações que constam no processo que tramita na 3ª Vara Federal de Campo Grande. Na lista, o  magistrado quer saber quais  bens já foram apreendidos e bloqueados, além dos dispositivos eletrônicos, com pendrives, computadores, celular, HDs e as respectivas perícias.

Também pediu informações acerca da apreensão de ativos virtuais (criptomoedas) vinculados aos CPFs e CNPJs dos requeridos e sobre eventual manutenção da prisão de alguns dos citados ou da apreensão dos passaportes dos requeridos.

A advogada não quis entrar em detalhes sobre os citados na ação estadual, por tramitar em segredo de Justiça.

Mayra Dias explicou que, em caso de bloqueio e sendo localizado, os valores e bens são penhorados, ficando no aguardo da decisão da ação civil pública, transferidos para conta judicial vinculada ao processo. Posteriormente, com julgamento definitivo, os investidores lesados comprovam o valor perdido e entram na fila para execução.

“Catástrofe”

A investigação já em curso na esfera federal é decorrente da operação da PF, desencadeada em 19 de outubro de 2022 e que apurou crimes de lavagem de dinheiro, estelionato, organização criminosa e crimes contra a SFN (Sistema Financeiro Nacional). Estima-se que o prejuízo total aos clientes enganados pelo grupo chegue a R$ 4 bilhões.

No dia 6 de julho de 2023, a Justiça Federal aceitou a denúncia contra Diego Ribeiro Chaves, Fabiano Lorite de Lima, Diorge Roberto Araújo Chaves, Ivonélio Abrahão Silva, e Patrick Abrahão Santos Silva, respectivamente, pai e filho. Patrick é músico, empresário e casado com a cantora Perlla, dona do hit “Tremendo Vacilão”.

O rastro do esquema começou a ser seguido em 20 de agosto de 2021, na apreensão de 2,35 quilos de esmeraldas e de três homens, em abordagem feita pela PRF (Polícia Rodoviária Federal) em Rio Brilhante. As pedras estavam avaliadas em R$ 508 mil.

Conforme a denúncia ofertada pelo MPF (Ministério Público Federal), os acusados integraram a organização criminosa, pelo menos, no período entre maio de 2019 a outubro de 2022.

Os acusados eram parte do grupo empresarial denominado Trust Investing, por meio do qual realizavam a captação de recursos financeiros de terceiros, dentro e fora do Brasil, e aplicavam sem autorização legal no mercado de criptomoedas e outros ativos, assumindo as “feições de uma pirâmide financeira”, cita a denúncia.

“É descrito que a TRUST INVESTING oferecia serviços de investimentos com rentabilidade impraticável no mercado de ações (0,1% a 5% ao dia, 200% a 500% ao ano), contudo a empresa não existia oficialmente, de maneira documental, e tampouco dispunha de autorização de operação pela Comissão de Valores Mobiliários”, consta na denúncia.

A investigação da Polícia Federal reporta o caminho dos investimentos. Primeiro, a pessoa se cadastrava no site da Trust Investing, que ofertava planos de US$ 15,00 a US$ 100 mil dólares.

Com o cadastro, era gerada uma wallet (carteira) para o investidor, que seria usada para comprar e receber em criptoativos. Pagava-se o plano com o token (espécie de criptomoeda), que flutua na proporção de 1×1 com o dólar americano. Do total investido, 60% iriam para investimentos em trading (operações de compra e venda), criptomoedas e compra de outros ativos. Os outros 40% seriam para expansão da Trust, com cotas diárias disponibilizadas para saques.

Conforme denúncia do MPF, Patrick Abrahão intitulava-se “number one” da Trust Investing, sendo garoto-propaganda do grupo. Também foi lançada uma segunda criptomoeda, a Truster Energy, em outubro de 2021, com volume negociado acima do normal, segundo o MPF. Com apenas cinco carteiras de investimento, foi identificada movimentação de R$ 8.873 milhões.

As esmeraldas se encaixavam no segmento Trust Diamond. Os recursos dos investidores seriam convertidos em pedras preciosas custodiadas em um banco na Suíça ou no Brasil, as quais serviriam de garantia, caso a Trust não honrasse com o pactuado.

Ao aceitar a denúncia, naquele período, a juíza Júlia Cavalcante Silva Barbosa, da 3ª Vara Federal manteve a prisão preventiva dos réus, considerou o alcance do prejuízo causado pelo grupo. “(…) há que se considerar a magnitude da lesão a milhares de pessoas atingidas, em diversos países, tratando-se de uma catástrofe financeira (…)”.

No dia 8 de agosto de 2023, a Vara Federal revogou as prisões preventivas. No dia 24, Patrick Abrahão gravou live, negando os crimes e agradecendo por milhares de cartas que recebeu na temporada na prisão.

Em outubro daquele ano, a CPI das Pirâmides Financeiras (Comissão Parlamentar de Inquérito) aprovou relatório final e recomendou o indiciamento de 45 pessoas por “fortes indícios” de participação em esquemas de pirâmide financeira e pela prática de crimes como estelionato, lavagem de dinheiro e gestão fraudulenta.

FONTE: CAMPO GRANDE NEWS

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